sábado, 27 de junho de 2009

Quinta-feira, 00:40h

Observo fotos antigas, enquanto acendo mais um cigarro.
Parece que nada mudou em tantos meses de ausência. Ou então, talvez tenha apenas sonhado toda a minha viagem. E se de facto nunca tiver partido?

E porquê…
Porquê que a preto-e-branco as pessoas são mais belas?

J.F.
Relatado por Joszef

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Bristol Club. 22 de Junho 1927

Os fins de tarde passam de forma serena. É a hora que mais gosto no dia. O sol cede perante a lua e o escuro da noite. Deixa sempre uma sensação de felicidade nostálgica. As ruas estão vazias e o sol deixa um tom rosa no céu.
Estava a arrumar as cadeiras do salão com a porta do club aberta, para entrar a ultima luz do sol. O senhor Afonso estava a limpar copos no bar. Alguém pergunta se pode entrar. Era uma voz aguda, feminina, suave, educada. "Entre, já vou aí ter consigo". Subo as escadas e vejo...
Desta vez os olhos dele já não se cruzaram com os meus. Olhava para o chão ou desviava o olhar. Ao seu lado estava uma menina com os olhos mais azuis, que eram definitivamente os da mãe. "Papá, papá! Vai haver musica?".
"Eu mato-o!". Atropelando tudo e todos apareceu a senhora Adelaide num claro estado de nervosismo misturado com loucura.

domingo, 14 de junho de 2009

Quinta-feira, 00:30 horas

Mais uma noite no Bristol, a mesma madeira de mogno impregnada do cheiro a tabaco turco.
Hoje a noite está calma. Um jornal abandonado no balcão entre copos vazios de Whisky e Gin. Viro as páginas sem atenção. “Perigosos agitadores executados nos Estados Unidos”, parece que eram anarquistas italianos. “Tunney derrota Jack Dempsey em combate controverso”. Interessante, esperava que Dempsey conseguisse recuperar o título mundial.
Largo o jornal e olho para o relógio. Já passa da meia-noite. Ontem ouvi uma história curiosa sobre um amigo de um amigo. Um verdadeiro Don Juan, conseguia conquistar qualquer rapariga. A técnica? Sempre a mesma. Aproximava-se e perguntava as horas. Em seguida olhava-a nos olhos dizendo: “por te ter encontrado, vou recordar para sempre este minuto”.
Bela história. Parece saída de um filme. Podia aproveitá-la, não escrevo nada desde segunda.
Do outro lado da sala senta-se uma rapariga. Morena, olhos verdes. Não sei porque ocorre-me aquele choque momentâneo de há alguns dias. Será a mesma rapariga?

J.F.

Sábado, 01:00

Desde que esbocei o inicio daquela história, na Segunda-feira de madrugada, não a consegui retomar. Todas as noites tento escrever, todas as noites acabo por ficar no Bristol.
Para ser perfeitamente honesto, devo dizer que mesmo quando escrevo não abandono este lugar. A história que comecei passa-se aqui, de uma forma ou de outra.
Um Bristol Club de fantasia, que é ao mesmo tão real como este onde me encontro. Um narrador que já não distingo de mim próprio. E um par de olhos verdes que me atormentam, tal como perseguem a personagem que criei.
Quem de nós será então o mais real? Qual de nós a personagem, qual o autor?
Talvez seja este o meu problema: pensar demasiado, cair em solipsismos.
Sei que não devia ter passado para o papel aquele esboço, citar uma rumba foi aproximar-me do ridículo. De qualquer das maneiras não tenho tempo de o desenvolver. As malas estão feitas e o Capitão Marlow disse que zarpamos de manhã cedo.
Peço outro whisky e vejo as horas passar.

J.F.
Relatado por Joszef

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Bristol Club. 11 de Junho 1927

A verdade é que a senhora Clara tem-me deixado bastante ocupada. Passa por cá todos os dias sempre que pode controlando o menino Francisco. Será que ele não pode ser despedido? Trabalha como funcionário na pasta das colónias, assim mo disse a Raquel e a senhora da limpeza. Será que nada lá acontece? Estar-se-à a viver tão bem que até os funcionários se dão aos luxos da vida urbana de Lisboa durante quase todo o dia? Entrando pelas portas traseiras e interrompendo muitas vezes conversas com o senhor Afonso no escritório, só para fugir ao controlo da sua mãe?
O senhor Afonso continua a chegar tarde a casa. Recebi um bilhete da Adelaide dizendo para me lembrar da nossa conversa. No entanto ele sai mais cedo. Sou eu que tenho de arrumar as garrafas e fazer a reposição. Não tarda estará também a inspeccionar as redondezas. Desconfio...

sábado, 6 de junho de 2009

Sábado, 03:05 horas

Sempre gostei do fumo do tabaco a envolver-me. Relaxar num clube como este, um dos pequenos prazeres de uma existência banal. Sem querer, esta noite ao entrar, choquei com uma rapariga. Mas, quando me voltei para pedir desculpa já não a vi. Curioso, pensar que estivemos tão próximos por um segundo.
Um segundo? 0,0001 segundos, uma mera fracção de fracção.
Dois estranhos. Provavelmente nunca nos voltaremos a cruzar nesta vida. Mas naquele momento preciso estivemos tão próximos.

72 horas depois, deste lugar onde me sento, um homem observa esta rapariga e apaixona-se.

J.F.

Segunda-feira, 05:23

Os olhos de quem se ama nunca se vêem, capitulo I

Estranho, como uma simples troca de olhares consegue despertar um sentimento adormecido. Cruel, como uma simples troca de palavras destrói tantas ilusões. Entrei neste clube, como podia ter entrado em qualquer outro desta cidade. Sentei-me neste lugar, entre tantos, e ao olhar em frente apaixonei-me por um par de olhos verdes.

Aquellos ojos verdes…

Uma bebida, outra, talvez mais uma ainda para ganhar coragem. Uma troca de palavras que rapidamente se transforma numa conversa. Ilusões, apenas ilusões desmoronadas por uma simples expressão: “o timing foi mau…”. O tempo, sempre o tempo, o verdadeiro inimigo.
Continuo sentado no meu lugar, uma bebida, talvez outra, para esquecer.


Relatado por Joszef