domingo, 28 de fevereiro de 2010

Bristol Club. 28 Fevereiro 1928

E os dias passam. Nada muda. Nada mudou.
Os grandes de Lisboa continuam a beber. As senhoras continuam a falar.
A polícia continua a tirar notas e a prender pessoas. Os miúdos continuam a brincar. O pianista continua a tocar e a inventar letras, que nunca poderão sair da sua cabeça.
O Miguel continua a enviar cartas do Brasil e ainda não decidi se escrevo de volta.

A única coisa que mudou foi a barriga da Catarina que está cada vez maior.
Dentro de mim também cresce uma angústia que não sei de onde vem.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Sábado, 00h15

Bristol Club ao som do fox-trot.

Toda a gente parece alegre. Enquanto uns dançam, outros bebem e conversam com as suas mulheres ou amantes e outros ainda, sem companhia melhor, conversam consigo próprios.
Junto ao balcão, onde peço um whisky, Miss L ouve as histórias tristes do costume. Vidas perdidas, empregos entediantes, esposas insatisfeitas e amantes que pesam na carteira. Enquanto bebo sorrio e penso que já estive neste mesmo lugar a dizer estas mesmas coisas. Às vezes é bom ser ouvido…

Mas não hoje. Hoje joga-se bridge na mesa do canto. A menina M., filha do embaixador inglês, trouxe dois conhecidos e temos passado as horas entre partidas. M. é a minha parceira e nunca tinha perdido tanto na vida. Jovem e ambiciosa seria uma bela femme fatale, se não fosse tão imatura.
Ao fim de 3 whiskies não consigo recordar os nomes dos seus amigos. Apenas sei que se trata de um funcionário da embaixada, burocrata apagado, e de um oficial em licença do exército britânico, frio e fleumático como se exige de um gentleman.

Inicia-se o leilão. M aposta 10 vazas, trunfo copas. Mais uma derrota.

O oficial inglês gaba-se dos seus feitos nas campanhas africanas da última guerra. Enquanto me cabe o lugar do morto abstraio-me da conversa e penso na minha infrutífera investigação. Ao fim de uma semana a percorrer redacções, registos militares e bibliotecas, continuo sem saber quem é o Major Lobo d’África.

-And I met one Lopo de Afrrrica, that was is name. Crazy portuguese officer he was, killing germans for fun in Mozambique. The scariest bastard I’ve ever met, if you excuse my language miss.

Esta conversa voltou a interessar-me. Parece que ainda há dias de sorte…

Relatado por Joszef

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Bristol Club. 5 Fevereiro 1929

Todas as noites há sempre alguém que se embebeda. Fazem-no porque se querem divertir mais, porque estão tristes demais ou simplesmente com coragem a menos.
Todas as noites há cenas de macacadas que metem todo o club a rir. A música pára para focar a atenção no espectáculo e o publico no final, quando a coisa começa a descambar, com relutância arrasta os loucos para a rua. Todas as noites há mulheres que vêm buscar os seus maridos ou filhos, que já nem sabem onde estão. Todas as noites as raparigas se queixam de um ou outro homem, que se atrevem demais, sob o efeito do álcool, e todas as noites o Luís tem de ir resgatar a Rute ou a Sandra.
Mas do que mais gosto é quando estou atrás do balcão e me dizem o que lhes vai na alma e no coração. Uma verdadeira poção divina. Não há maneira de esconder. É a essência da pessoa a emergir. O álcool destrói amarras e muralhas de castelos.